sábado, 21 de novembro de 2009

EU ACEITO ESTE DESAFIO!




AUTOBIOGRAFIA
Filha mais velha de um caminhoneiro e de uma recepcionista, provenientes de uma família grande do interior, tive uma infância “curta”, porém repleta de aprendizagens. Nascida em 27 de julho de 1989, em Osório, morei até os 3 anos em uma casa de alvenaria em Santa Terezinha. Presenciei dificuldades financeiras, temporais monstruosos, bem como a perda do emprego de caminhoneiro do meu pai _ agora ele era “pai de família”, não poderia se afastar por muito tempo de casa. Com isso, lembro-me que as coisas pioraram, passamos a alugar nossa casa durante o veraneio, período em que nos mudávamos para a garagem dos fundos. Meu pai ia vender espigas de milho em seu “super-carrinho” na beira da praia e eu... bom, eu ia junto! Adorava ver aquele “monte” de gente, correr pelas dunas, fazer propaganda do milho, que era excelente por sinal! Durante o inverno, meu pai trocava de serviço, e ia trabalhar como pedreiro, fazendo “bicos” junto com meu tio. Não precisa nem dizer que eu também estava lá, né?! Até ajudava a colocar alguns tijolos... Em 1992, meus pais se mudaram para Noiva do Mar, onde construíam um pequeno mercado, a fim de melhorar de vida. Lembro de subir nas escadas, levar diversos tombos... Mas eu me divertia muito!
Aos 5 anos, minha mãe precisou me colocar na creche; era verão e ela não tinha com quem me deixar. Ficar comigo no mercado, então, nem pensar! Era muita correria, não tinha jeito. Além do que eu ia atrás de qualquer conversa. Devido a isso, praticamente todos os clientes me conheciam... Na creche, improvisada nas salas da escola de ensino fundamental por causa da grande demanda, lembro-me de entrar pela manhã e sair somente de tardezinha.
Nada de brincar no pátio, assistir tv ou filmes... Até mesmo as refeições eram realizadas ali dentro! Na porta da sala de aula sempre havia uma “tia” que controlava quem entrava e saía... Nós não podíamos sair, a não ser que fosse para ir ao banheiro acompanhado por uma delas. Naquele mesmo ano, em março, entrei para a Pré-Escola. A professora era muito simpática, realizava diversas brincadeiras, sempre nos ensinando algo através delas. Algo que muito me marcou foi um episódio em que meu colega perguntou por que ela era tão preta, e ela respondeu “Porque eu sou feita de chocolate!”. Aquilo me encantou muito, e recordo dele perguntar se podia dar uma ”lambidinha” para ver se era de verdade... Depois veio a formatura, com aquelas togas feitas de papel crepom azul marinho... Primeira série, se quer lembro da professora!! Mas recordo de ter aprendido a ler. Minha mãe sempre lia jornal comigo no seu colo, até que um dia... click!! Estava olhando aquelas letrinhas e entendi o que estava escrito!! Minha mãe não acreditava, tanto que me pediu para ler o que estava escrito ali. Eu li. E li correto!! Que felicidade! Os demais anos, como estes, reservaram muitas surpresas, aprendizagens e tantas outras situações inusitadas... Matemática era algo que eu amava! Principalmente a partir da 4ª série, quando teve uma Corrida de matemática na sala de aula. A professora colocou as classes no fundo da sala, lado a lado, e ia escrevendo probleminhas no quadro. Dado o sinal, resolvíamos e o primeiro a terminar levantava a mão; se estivesse certa a resposta, poderia avançar uma classe. O vencedor ganharia um presente de final de ano... e eu ganhei!! Foi muito legal!
Terminado o ensino fundamental fui para uma escola um pouco mais distante, de ensino médio, que recém havia sido inaugurada. Poucos recursos, vontade de estudar mais escassa ainda... Estudei lá por 1 ano e meio; cheguei ao ponto de quase rodar por falta de notas. Foi então que algumas circunstâncias me obrigaram a mudar o rumo de minha vida; do jeito que tava não dava mais. Fui morar no interior, “na grota” como muitos dizem! A experiência de mudar de escola na metade do ano letivo, para um lugar totalmente estranho foi algo inesquecível. O pavor dos primeiros dias, dos primeiros contatos, da nova rotina, da nova realidade... Mas foi algo que, com o tempo, serviu de incentivo para buscar cada vez mais. Participei da Olimpíada de Matemática (OBMEP) e, além de passar para a 2ª fase, ainda alcancei o 2° lugar na colocação geral da escola. Isso contribuiu e muito para aumentar meu círculo de amizades! Meu primo, sempre parceria pras minhas idéias, também passou... Em 1° lugar! Via nele um exemplo de perseverança, de companheirismo. Se consegui entrar no ritmo dos estudos naquele semestre foi graças ao empréstimo dos cadernos do ano anterior dele, afinal, os professores ainda davam praticamente os mesmos conteúdos e na mesma ordem!! Estudar e ler livros, depois que descobri onde ficava a biblioteca municipal, foram meus passatempos preferidos, até porque a saudade só aumentava e a rotina me consumia!

Apesar de não pretender fazer faculdade, no final do “terceirão” já havia decidido que tentaria prestar vestibular para Fisioterapia. A dor foi saber que, para isso, eu teria que largar tudo o que eu havia construído lá, para voltar a morar com meus pais. Mas tudo bem, mesmo com a distância, as amizades se fizeram presentes! Concluí o ensino médio, se quer fiz formatura, pois o vestibular era no mesmo dia. Tendo passado na Ulbra/Torres para o curso desejado, chega a hora da matrícula; que decepção! Para fazer duas cadeiras, mínimo que se poderia cursar, meus pais já não teriam como arcar. No mesmo dia, então, eu e minha mãe fomos direto pra Osório, último dia de inscrição para o vestibular de verão da Facos 2007/1. Na hora de dizer os cursos foi uma confusão só... “Ah! Sei lá! Bota aí... Pedagogia, Matemática, Administração...É! Acho que é isso...” Nem eu sabia o que eu queria... Afinal, ia fazer só por fazer, depois, com o tempo, trocaria de curso. Passei em primeira opção, mas meu maior orgulho foi ter uma faixa de “bixo”, ainda por cima duplo, na frente do comércio!!! Iniciei o curso de Pedagogia tendo, de cara, uma disciplina de prática pedagógica. Para realizar a tal prática, conversei com a diretora da escola fundamental onde estudei. Gostei da experiência; e ela, do meu trabalho! Logo perguntou se eu gostaria de estagiar lá e coisa e tal. Claro que eu queria!! Não tanto pelo trabalhar, mas porque eu precisava e queria arcar com minhas despesas acadêmicas. Lembro de ter sido chamada numa quinta-feira; na sexta eu já deveria ir à escola para elaborar as aulas. Como eu ia trabalhar de professora itinerante, aquela que substitui o professor no seu dia de planejamento, teria que me interar dos conteúdos do 2° ano, 2ª, 3ª e 4ª séries, as turmas nas quais eu iria atuar uma vez por semana. Que coisa mais fácil!! Era só pegar um texto, fazer questões para interpretar, alguns probleminhas e deu tá pronto! Hoje eu vejo quantas “cagadas” eu fiz!! Não era por menos que eu saía nas primeiras semanas chorando da escola; queria desistir, aquilo não era pra mim! Bagunça, enfrentamento, deboche... Que crianças eram aquelas??! Cadê o respeito pela professora? Eu não entendia aquilo, mas continuava dando as aulas do mesmo jeito; era assim que eu achava que tinha que ser. No verão, com o final do ano letivo, fui redirecionada, assim como os demais estagiários, para trabalhar com educação infantil. Não quis mais sair de lá! Aquelas crianças tão carinhosas, carentes, pequenas... Ali sim eu me senti professora! Ali sim havia respeito! Pelo menos no meu entender... Bom, desde então trabalho nesta escolinha, tendo passado pelos mais diversos níveis, desde o berçário até o pré dos maiores. No início de 2009, realizei meu estágio supervisionado de educação infantil neste local. Como era difícil elaborar uma aula partindo de objetivos, de um projeto elaborado previamente. Para piorar ainda mais a situação, na semana em que iria iniciar meu estágio recebi a triste notícia de que meu primo, aquele que tanto me ajudara, havia falecido tragicamente. Pensei em desistir. Eu não tinha condições de assumir o papel de professora se quer de finalizar a elaboração das aulas. Como ele estava fora do país devido ao intercâmbio que estava fazendo, não ter notícias precisas e claras nos consumia cada vez mais. Seis dias...este foi o tempo que a situação se arrastou até finalizar-se na celebração fúnebre. Eu não acreditava; mesmo vendo, ainda tinha esperanças de que tudo fosse um terrível engano...ou um pesadelo. Mas não foi. Mesmo assim, iniciei meu estágio, meio perdida, mas procurando seguir em frente, afinal, tudo tem solução, menos a morte. Comecei a me dedicar muito aos planejamentos, me cobrava bastante quanto ao significado que as aulas teriam que ter para os alunos. Esta também foi a forma que encontrei para não pensar, não lembrar da dor. A turma me ajudou muito, eram bastante curiosos e colaboravam com as atividades. Traziam novidades, interagiam, até porque o assunto era do conhecimento deles: profissões. Sei que, na última semana, até sem voz eu fiquei! O estresse chegou a tal ponto que eu não conseguia emitir um som se quer! Mas, por sorte, a professora titular foi bastante prestativa, fazendo-se de “porta-voz”. Foi uma experiência bastante rica pra mim.
Ainda hoje, não sei dizer se minha área é a infantil ou se é a do ensino fundamental... Mas tenho certeza de que, na próxima oportunidade que eu tiver para trabalhar com séries iniciais, agirei de forma diferente, não farei como fiz no início. Errei? Sim, mas foi necessário para que eu visse, na prática, o que no decorrer do curso eu iria escutar na teoria: “é necessário mudar a realidade escolar”, “precisamos agir de forma diferente”, “o aluno precisa sentir prazer em aprender, em ir para a escola”. E cabe a nós, professoras, construir esta nova realidade. E eu aceito este desafio!
Juliete Goecks Machemann, acadêmica do 6° semestre de Pedagogia, Facos/Osório.
Novembro de 2009.

4 comentários:

daniela disse...

menina que lindo o que tu escreveu...tu será e ja e uma otima profe...vai fazer diferença sim, o uqe é muito importante pra nossosatuais e atribulados tempos.bj

D@y@ disse...

Nossa amiga, eu também aceito este desafio... Desafio este que nos faz ser cada vez mais capazes de fazer a diferença. Adorei o que tu escreveu. Parabéns!!!

Anônimo disse...

Lembro daquele dia..... Mto triste...

Simplesmente Eu disse...

Fico feliz em fazer parte de sua vida nessa história, pena que não foi da maneira que imaginava que faria. Grande mulher, parabéns pelas conquistas, sempre torci por você. Grande Abraço e que continue nesse caminho correto que sempre seguiu. Att GG