quarta-feira, 19 de maio de 2010

Uma colcha de retalhos em construção



Era 29 de janeiro de 1985, as contrações começaram e o bebê esperado para e metade de fevereiro dava sinais de querer chegar antes do tempo, as 11h e 10 minutos nascia na cidade de Três Passos, Elisangela Lopes.
Filha de ex- agricultores, que devido as condições da época e falta de incentivo das famílias e falta de recursos estudaram somente até a quinta-série, mas na época do meu nascimento meu pai já estava trabalhando na Brigada Militar e minha mãe dona-de-casa. Acredito que, de tanta vontade que meus pais tinham em continuar a estudar, nunca mediram esforços para que nós, eu e minhas 2 irmãs, pudéssemos freqüentar a escola.
Era uma criança que não parava um minuto, estava a toda hora fazendo perguntas, queria saber tudo, eram muitas dúvidas, e queria muito escrever meu nome e aprender a ler. Fazia todos os dias a minha mãe me ajudar a escrever meu nome, eu tinha 5 anos.
Aos 6 anos, eu queria muito ir à escola, incomodei tanto que matricularam-me na escola, e ainda minha professora seria uma grande amiga dos meus pais, a professora Cleci, que eu conhecia somente por Gringa. Lembro-me das incansáveis folhas de caderno preenchendo a linha, treinando caligrafia, identificar nos conjuntos a quantidade de objetos, era julho quando finalmente, aprendi a ler. Para NEGRINE (1994:20) "Quando a criança chega à escola, traz consigo toda uma pré-história, construída a partir de suas vivências, grande parte delas através da atividade lúdica."
Estava radiante, até o dia em que meu pai avisou que havia pedido sua transferência para Capão da Canoa, meu mundo desabou, teria de deixar amigos, vizinhos, escola, colegas, tudo para trás. Fiquei chateadíssima, chorei, mas de nada adiantaria, já estava acertada a transferência. Finalmente em agosto nos mudamos para Capão da Canoa, meu pai nos matriculou na Escola Jorge Dariva, estudamos lá durante uma semana, tenho a terrível lembrança da professora com uma régua enorme na mão, que batia nas mesas dos alunos quando eles conversavam.
Depois de uma semana, meu pai achou um lugar mais amplo para morarmos e precisávamos fazer mais uma mudança, iríamos mudar de bairro, e mais uma vez era necessário mudar de escola.
Eu chorava todos os dias, não queria que minha irmã voltasse para casa, queria poder ir embora com ela. Não conseguia me adaptar a escola nova, era tudo muito diferente, em Três Passos, falávamos: leite, caroça (carroça), já em Capão as pessoas falavam: leiti, carro, denti, era muita diferença cultural.
Em um ano foram 3 escolas, mas consegui ser aprovada e ainda aprendi a ler e escrever. No ano seguinte mais uma mudança e voltamos para a Escola Jorge Dariva, da 2ª até 8ª série estudei nessa escola, foram anos incríveis, nunca esqueço que na 6ª série tive minha primeira nota vermelha, em História, a média era 60 e eu tirei 45.
Em 1998, eu tinha 13anos, estava na 8ª série, era final de ano, época de decidir o que fazer, tinha de decidir se faria ensino médio ou faria o curso normal. Foram muitas conversas com meus pais, feitos muitos cálculos, e resolvi que faria o curso de magistério. Foram 3 anos de muita aprendizagem, conheci pessoas maravilhosas, cada mestre mais especial que o outro, mas mesmo assim não tinha certeza se era isso mesmo que eu queria. Até o dia de fazer o mini- estágio, achei o máximo, fiz cada atividade interessante, me senti realizada.
Durante o período de estágio do magistério, foram 6 meses que senti grande responsabilidade sobre meus ombros, no inicio pensava em desistir, mas logo pensava que se havia começado o estágio, havia de terminá-lo.



Aos poucos fui acostumando-me a ter pelos menos 25 crianças sob minha responsabilidade, algo emocionante, todos os dias eu tive vários “fãs” que por nem um minuto deixavam-me silenciar. Queriam saber de tudo e assim tentei solucionar suas dúvidas. Tive muitas alegrias e algumas tristezas, afinal nem tudo é perfeito.
Perdi a pessoa mais importante na minha vida, minha mãe, a grande inspiração para seguir minha caminhada, era ela quem me incentivava, era ela quem ficava até de madrugada me ajudando a montar as aulas práticas, acho que esse era o seu sonho: ser professora, e que aos poucos foi sendo o meu também. Mas ganhei o carinho e amor da minha turminha, da minha professora titular, que havia sido minha professora lá na 5ª série, e ainda lembrava de mim, recebi o apoio dos pais e de todo corpo docente da Escola em que fazia o estágio, aprendi coisas que jamais esquecerei. Fiz a formatura, e até o anel eu ganhei, embora o que mais quisesse era um abraço da minha mãe.
Depois de todas essa mudanças na minha vida, fui trabalhar no comércio, havia perdido minha mãe e a vontade de estar em contato com a escola, com a educação. Mas queria fazer vestibular, por curiosidade e também para saber como me sairia. Fiz então o vestibular de verão na Unisc, para o curso de Sistemas de Informação, sem ter estudado, fui fazer a prova, sem convicção de que passaria, porém no dia da Lista de aprovados, meu nome estava lá, com nota não muito boa e média pior ainda.
Me matriculei no curso, estudei por 4 semestres, foram 13 cadeiras, e mesmo assim me sentia vazia, sentia que faltava algo, resolvi então trancar o curso. Fiquei descansando por 2 anos, e tentando descobrir algum curso que me chamasse a atenção. Coloquei tudo na balança e foi só ali que percebi que não era tarde para voltar a usar os conhecimentos do curso de magistério, resolvi fazer pedagogia, fiz o vestibular e passei.
Em 2007/1, estava dando inicio a mais uma etapa na minha vida, hoje estou no 6º semestre, já construí alguns conhecimentos, digo sempre que comecei a construir a minha colcha de retalhos, já agreguei alguns retalhos, outros ainda estão sendo agregados e tantos outros que virão. Faço Pedagogia por que acredito que o mundo ainda tenha solução e eu quero fazer a minha parte.



"Não é possível refazer este país, democratizá-lo,humanizá-lo,torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, viabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda." ( Paulo Freire )

" O nascimento do pensamento é igual ao nascimento de uma criança: tudo começa com um ato de amor. Uma semente há de ser depositada no ventre vazio. E a semente do pensamento é o sonho. Por isso os educadores, antes de serem especialistas em ferramentas do saber, deveriam ser especialistas em amor: intérpretes de sonhos."
( Rubem Alves )

Elisângela Lopes

Um comentário:

Aline Neves disse...

Elis! Tua força de vontade, alegria e determinação fazem com que a cada dia eu te admire mais e mais! É muito bom ser tua AMIGA, quase IRMÃ!!! Te adoro de montão!!!